01/08/2011 | EDITORIAL do jornal Cruzeiro do Sul em Sorocaba -SP muito oportuno para ser discutido aqui.
O avanço do exército amarelo
Infrações e comportamentos de risco devem ser punidos exemplarmente, até que se crie a consciência? ou, na falta dela, o receio - de que é melhor seguir as normas
Os amarelinhos superaram todas as expectativas. Quem previu que haveria uma avalancha de multas com a entrada em operação da equipe de fiscalização do trânsito, em janeiro deste ano, não errou. No balanço do primeiro quadrimestre, a arrecadação de multas foi de R$ 4.426.701,56, contra R$ 2.511.573,95 no mesmo período do ano passado ("Fiscalização - Multas de trânsito crescem 78% com a atuação dos amarelinhos", 28/7, pág. A5). É uma indústria de multas, sem dúvida, mas não se pode condená-la. Não sem levar em conta seus resultados, que são, em última instância, aquilo que todos almejam: um trânsito menos perigoso.
O Brasil é um caso único em todo o mundo. Poucos povos desfrutam de tanta liberdade, em todos os aspectos da vida pessoal, social e política. Cada vez mais, porém - por exigência da própria sociedade, que muitas vezes se sente acuada pelo comportamento de indivíduos ou de grupos -, o Brasil se torna um Estado policialesco, em que a falta de limites de uma parte das pessoas leva à edição de calhamaços de leis para proibir isto ou aquilo, à formação de milícias públicas ou particulares e à implantação de olhares eletrônicos por toda parte, a fim de coibir comportamentos criminosos e abusivos.
E nada melhor para traduzir o espírito paradoxal de um país que às vezes parece uma terra sem lei, ao mesmo tempo em que possui tantas leis para regular as mínimas coisas, do que o trânsito, esse sistema de uso coletivo em que o Estado é chamado a assumir a tutela de cidadãos em pleno domínio de seus deveres e direitos, para exigir deles uma atitude que, num mundo ideal, deveria depender apenas da consciência de cada um. Nada ilustra melhor essa situação absurda do que a necessidade de fiscalização, com ameaça de multas e outras sanções, para o uso de capacete e de cinto de segurança, acessórios cujo uso deveria interessar primordialmente ao próprio condutor.
No contexto da verdadeira tragédia cotidiana que é o trânsito brasileiro, a repressão pode ser antipática, mas é indispensável. Veículos e condutores sem condições de transitar devem ser tirados das ruas, para garantir a segurança de todos os usuários. Infrações e comportamentos de risco devem ser punidos exemplarmente, até que se crie a consciência - ou, na falta dela, o receio - de que é melhor seguir as normas para não ser molestado ou ter prejuízo. Um trânsito fortemente vigiado é, infelizmente, a melhor ¿ e, ainda assim, tênue - chance que se tem, a curto prazo, de fazer com que o número de mortos e feridos desse massacre estúpido possa diminuir.
A "indústria" de multas, incrementada pela ação dos amarelinhos ¿ e que está em vias de ser expandida ainda mais com a ampliação do quadro desses servidores -, seria arrecadatória e totalmente dispensável se as multas aplicadas se destinassem a punir infrações sem maiores consequências, como estacionamento em locais proibidos, por exemplo. O balanço quadrimestral, no entanto, indica a intervenção da equipe no combate a infrações realmente importantes, como trafegar em excesso de velocidade (primeiro lugar no ranking das multas), dirigir falando ao celular, avançar sinal fechado e trafegar sem cinto de segurança.
Desde que haja possibilidade de recursos, para que se viabilize a correção de eventuais erros, e um cuidado para que a atuação dos fiscais ocorra em toda a cidade, mediante a elaboração de mapas com os pontos críticos onde há mais infrações e acidentes, essa ofensiva do exército das multas deverá proporcionar bons resultados para o trânsito como um todo, com reflexos inevitáveis no nível de segurança desfrutado por motoristas e pedestres.
É uma situação ideal? Certamente que não. Mas, quer se queira, quer não, é a linguagem que todos entendem
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