quinta-feira, 27 de março de 2008

Prefeitura privatizará o trânsito; radares e “pardais” voltam às ruas

Ano eleitoral. Um projeto de lei, assinado pelo prefeito Wilson Santos, chegou a Câmara Municipal de Cuiabá nesta terça-feira. Quieto e sem alarde. O projeto autoriza o Executivo a “outorgar, mediante licitação, concessão através de parceria público-privada para operação dos serviços de trânsito, pavimentação e manutenção das vias públicas do município”. A proposta significa privatização de boa parte da responsabilidade do Poder Público. E mais: decreta a volta dos radares e “pardais” às ruas de Cuiabá.

A nova modalidade de gestão pelo sistema público-privado causa sobressaltos. Exemplo disso é a parte do projeto que diz que a Prefeitura fica autorizada a “vincular todo repasse constitucional de IPVA” (Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores) realizado pelo Governo do Estado bem como “todas as demais receitas advindas de serviços de trânsito” para garantir o funcionamento da empresa a ser contratada.

Especialistas avaliam que a vinculação de impostos para toda e qualquer atividade é flagrantemente inconstitucional. Fora isso, se prevalecer o desejo do Poder Público, a empresa a vencer a concorrência terá “super-poderes”, com esvaziamento da Secretaria Municipal de Trânsito e Transportes e Urbanos, que passará a cuidar apenas de transporte coletivo da cidade, e de parte da Secretaria de Obras, já que até a manutenção das vias públicas, pela proposta, também passará a ser dessa empresa.

Ao todo, a empresa que vencer a concorrência poderá explorar 12 serviços no trânsito cuiabano. Começa com uma novidade: o serviço de cobrança de pedágio por tráfego estimado. Apesar disso, a proposta não informa quem vai fazer a estimativa do trafego, e qual o critério que a Prefeitura vai usar para efetuar o pagamento.

Porém, o grande filão do negócio é algo já bem antigo: as multas. Pelo projeto, a empresa ficará responsável pelo serviço de instalação e operação de equipamentos de detecção automática de infrações de trânsito por tráfego em excesso de velocidade e/ou desrespeito à faixa de pedestres e ao semáforo vermelho nas vias públicas urbanas, inclusive o processo das respectivas imagens e dados. Isto é: pardais, radares, lombadas eletrônicas e outros apetrechos que tanto causam protestos estarão nas ruas da cidade.

Hoje, somente com as multas de trânsito, o Estado repassa para a Prefeitura de Cuiabá mensalmente em torno de R$ 300 mil. Dinheiro que não será usado pela Prefeitura mais. Se aprovado, o dinheiro será administrado pela empresa. “Estranho observar que o projeto inteiro não cita uma linha sequer de investimento em educação no trânsito. Uma parte do dinheiro das multas deveria ser usado para esse fim. Esse projeto tem toda a pinta de um “caça-níqueis” inominável” – frisou o especialista.

Dono de maioria no Legislativo, o projeto pode ser aprovado nas próximas horas, embora vereadores de oposição e até da situação tivessem estranhado o projeto. “Não estava sabendo de nada” – disse um aliado do prefeito, que prometeu estudar a matéria. Opositores evitaram maiores comentários, mas já se fala até em medidas judiciais para “barrar” a transferência de responsabilidade pública para uma empresa. Até porque o projeto, a primeira leitura, é absolutamente obscuro em vários pontos.

No ano passado, nesta mesma época, o Tribunal de Justiça confirmou a sentença da 2ª Vara da Fazenda Pública que anulou os contratos firmados pela prefeitura de Cuiabá com empresas de monitoramento eletrônico de trânsito. Manteve, ainda, a revogação das multas aplicadas pelos radares – os chamados “pardais”. Na época, o relator do processo, desembargador Rubens de Oliveira, explicitou que o serviço contrariava os princípios da legalidade e da impessoalidade, ao transferir funções tipicamente públicas às mãos de particulares. O desembargador ressaltava que o Executivo havia transferido o poder de Polícia para uma empresa privada.


Fonte http://www.24horasnews.com.br/

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